terça-feira, 6 de fevereiro de 2018



Resultado de imagem para poligamia POLIGAMIA. 

CHEGOU A HORA DE ENTENDER

 ISSO  AFRICANAMENTE

ANIN URASSE

Inicio esse texto fazendo algumas apresentações                             conceituais básicas.

      A primeira é dizer que poligamia NÃO É sinônimo de poliamor, amor livre, ménage, relação aberta, swing ou qualquer coisa que o valha. O que diferencia a poligamia dessas outras “nomenclaturas” é o seu foco na construção familiar e fortalecimento de um povo (o que é muito diferente de satisfação de um prazer hedonista individual.). Portanto, a poligamia é um modelo de casamento tipicamente AFRICANO, um modelo MILENAR de família, com foco na expansão COMUNITÁRIA e fortalecimento

 DE UM POVO. O tal “poliamor” e seus congêneres são criações eurocentricas recentes e remontam a um povo que só descobriu o corpo no século XX.

 (Alias, não é à toa que em geral somos mais abertos ao “poliamor” do que à “poligamia”. Somos levados a odiar tudo o que é africano). Tendo feito essa primeira diferenciação, vamos aos tipos de poligamia.

Existem três tipos de poligamia: poliginia, poliandria e poligamia grupal. Poliginia = 1 homem várias mulheres; poliandria = 1 mulher vários homens; Poligamia grupal = vários homens e várias mulheres (atenção: estou falando da criação de FAMÍLIAS e não de suruba). Todos os 3 tipos são encontrados em África.

         Apesar de todos os 3 tipos de poligamia serem encontrados em África, a poliginia (1 homem + várias mulheres) é disparadamente a majoritária (uns 96%?), seguida da poliandria e da poligamia grupal. Além dos erros comuns que colocam a poligamia como sinônimo de poliamor, ou poligamia como sinônimo de poliginia, há a comum interpretação “poliginia é machismo”. Como optei por analisar os nossos fenômenos a partir de uma visão africana, vamos ver o que diferencia a poliginia da poliandria começando por essa última.

A poliandria (1 mulher vários homens), ocorre em contextos africanos em que o número de homens é maior que o número de mulheres (o que é bem lógico). Um exemplo típico é o Quilombo de Palmares (Clovis Moura descreve a poliandria palmarina). Precisamos lembrar que na primeira fase da escravização, a maior parte de nosso povo escravizado era composta por homens (alguns autores falam de uma relação de 1 mulher para 7 a 10 homens). Assim, as mulheres palmarinas tinham vários maridos não pelo motivo de “quero me esbaldar” mas por um fator social (veja: o foco não é o “eu” mas as condições do meu povo. Confere? Portanto não há lógica falar em poliandria num contexto onde homens são minoria só porque “eu quero”, confere?

 Podemos querer muitas coisas, sim. Mas esse querer é um querer egoísta ou pensando em termos de povo? Num contexto onde há mais mulheres que homens, se eu me caso com 4 deles eu tô pensando nas minhas irmãs?)

Em termos de origem, entretanto, Diop nos ensina que a poliandria é tradicionalmente BRANCA, EUROPEIA. E isso tem um motivo: numa sociedade PATRIARCAL, quanto MENOS mulheres eu inserir no grupo social MELHOR. A mulher é tida como um fardo. Assim, na poliandria do povo (branco) celta, por exemplo, 1 mulher tinha que dar conta de 10, 12 homens, irmãos entre si, pai e filho, novo, velho, não interessa. A mulher TINHA QUE estar disponível para vários homens. Esses homens disputavam entre si violentamente (lembram dos filmes de duelo onde a mocinha branca não opina e fica esperando o resultado do bang bang ? Pois é.). Além disso, numa poliandria não é possível saber quem é o pai da criança, o que desresponsabiliza os homens e pode levar a incestos sem que as pessoas tenham controle. Assim, dizer “poliginia é machismo, quero vários homens” não tem lógica nenhuma. É justamente o contrário.

Dito isso, é muito óbvio pensar que se em contextos patriarcais a poliandria predomina, em contextos africanos (logo, matriarcais) o predomínio é da poliginia. (Chamo atenção pra esse ponto: nossos ancestrais são tipicamente poligâmicos. Aliás, as diversas formas de poliginia africana foram usadas pelos colonizadores como exemplo do nosso primitivismo e promiscuidade. Desconfie de qualquer pessoa ou teoria que diga que o que os seus ancestrais fizeram largamente é errado. Isso tem nome: colonização).

Muito menos que mulheres se degladiando por um homem ou um homem oprimindo várias mulheres, na poliginia É A PRIMEIRA ESPOSA que define SE esse homem deve ter uma segunda, terceira ou quarta esposa (geralmente só vai até aí).

 Se a primeira esposa NÃO QUISER, não tem poligamia. Não é o homem que decide sozinho. É a matriarca. (Pelo menos é isso o que manda a tradição. Se as pessoas no seu cotidiano desrespeitam a tradição – e elas desrespeitam – aí já é outra discussão). Em muitos contextos, é a primeira esposa que ESCOLHE quem será a segunda (sim, escolha, porque na perspectiva africana amor não é aquele fogo inconsequente que a gente sente quando se apaixona no primeiro dia, mas uma construção que se dá ao longo de muitos anos). Cabe ainda à primeira esposa organizar, por exemplo o revezamento do marido: 1 semana com cada esposa? 3 dias com cada esposa? 1 dia com cada esposa? (varia a depender do povo em questão tb). É óbvio que a primeira esposa não é (ou não deveria ser) uma manda-chuva autoritária. De uma maneira geral acaba sendo um consenso. Mas existe uma liderança. E ela é feminina. (Por isso, minha irmã, se o pretinho tá insistindo em poligamia nos primeiros meses de namoro com o argumento de “sou poligâmico”, sai de baixo. Poligamia é constituição familiar. Projeto de vida. Compromisso. Não oba-oba amor livre.)

Numa poliginia, ainda, (e eu não tenho pretensão de ser imparcial, eu estou aqui para defendê-la em especial das deturpações ocidentais), as esposas são chamadas entre si de “co-esposas”, “co-irmãs”, ou seja, não é uma disputa de homem, são companheiras que decidem caminhar juntas na construção de uma família dividindo a casa, os recursos, o trabalho E o marido. Não são vítimas do julgo do homem, exploradas pelo patriarcado, coitadas sem escolhas ou desesperadas pela falta de homem, mas mulheres com agência que concordaram em construir uma vida em conjunto dividindo várias coisas inclusive o marido. Ainda: de uma maneira geral, as sociedades tem mais mulheres que homens (e até a biologia explica porque nascem mais meninas que meninos). Assim a poliginia contrabalanceia um fato social. Simples assim. (Eu costumo dizer que a África é muito lógica, sincera e prática).

https://pensamentosmulheristas.wordpress.com/2017/05/30/
sobre-poligamia-parte-1-ou-chegou-a-hora-de-enfrentar-esse-
debate-africanamente/

Nenhum comentário:

Postar um comentário